O tombo do diploma
que já havia caído
por Solange Pereira Pinto
As conversas nos botecos, chamados alternativos, e nas salas de aulas dos
cursos de comunicação rodaram feito peru bêbado em véspera de morte certa. Eram
papos geralmente inflamados contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF),
que declarou inconstitucional a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o
exercício da profissão. Uma insegurança e quase pânico assaltaram estudantes e
jornalistas, que falavam também em diplomas rasgados e extinção dos cursos de
comunicação.
Há coisas que estão além dos bancos escolares e das leituras obrigatórias selecionadas pelos professores A, B ou C. O que a decisão do STF mostra, em resumo, é que a vitória foi do empresariado enfim livre da contratação obrigatória de diplomados em jornalismo, podendo agora, sem fiscalização e riscos, colocar qualquer outro profissional na linha de produção (uma prática comum há tempos).
Curiosamente a decisão derruba o mito de que o jornalista é formador de opinião. Se houvesse realmente esse poder por parte dos “operadores da informação”, eles mesmos conseguiriam estampar em manchetes o debate e os riscos de extinção da “classe”. Assunto que pouco teve notoriedade nos veículos de comunicação.
O que se nota é que a formação de opinião é relacionada a outros poderes, principalmente o do capital e o de lugares de fala com mais status. Jornalista é nada. Jornalista (ou não) famoso (ou qualquer famoso) é “tudo”. Hoje se medem os minutos de fama e as contas bancárias polpudas para dizer "quem pode o quê e onde". Metros de disciplinas cursadas não servem (nunca serviram) para nada em se tratando de negociata, que fala outras linguagens menos sutis que o conhecimento verdadeiro.
Mais uma vez, a vitória é do mercado. Desta vez a reserva de mercado liberal (agir como quiser) dos empresários contra a reserva de mercado (educacional) de empregados jornalistas com diplomas. É a vitória contra o corporativismo de classe, diferentemente do que ocorre com os diplomados em Direito que se cercam cada vez mais de autorregulações e protecionismo (que particularmente sou contra por ferir alguns princípios meus, mas altamente compreensível em sociedades com grande numerário de gente ignorante).
Entretanto, o tombo do “grau” de jornalistas pode abrir uma chance ao autodidatismo, fator positivo neste país de educação formal falida e de fabriquetas de diplomas desde o ensino infantil. Torço para que caia agora o diploma da pedagogia, porque ensinar não se aprende em aulas de didática, ou não teríamos professores tão incapazes, analfabetos e rasos. Eu mesma não posso dar aulas para os ensinos médio e fundamental, enquanto alguns semianalfabetos com diploma de pedagogia de fundo de quintal podem. Bem como, administrador de empresas não se faz em faculdade, ou grandes conglomerados não teriam proprietários práticos, bem-sucedidos, e sem estudo. Torço pela queda da academia, finalmente, e seus títulos sobre títulos para se chegar a lugar algum. Aliás, lembremos da psicanálise que não é curso superior, contudo é sim formação. Neste caso vale o diploma? E psicólogo que faz terapia a partir de nota de rodapé de página de livro autoajuda vale certificado na parede?
Resumindo, quem vence na maioria das vezes, inclusive no caso em debate, é o interesse do capital e o lobby de alguns grupos; e no exercício raso da profissão isso vale tanto para jornalistas quanto para os magistrados e afins. Ou alguém ainda acha que a "linha editorial" do STF é isenta de interesses "publicitários"? Faz tempo que o governo e empresários contribuem para os votos relatados, que nada mais são que as matérias de capa do Supremo.
Nos tempos tecnológicos atuais só mudam os nomes das "mídias” e suas
vestimentas (togas, ternos, jeans), infelizmente. Resta a dúvida, será que para
advogar é mesmo necessário o diploma? Consultar códigos é mais pesquisa que
conhecimento incorporado, tanto que os concurseiros de plantão passam bem em
provas decorebas, as mais variadas, para serem serventuários da justiça em
cargos de “qualquer nível superior”. Desejo que se tombem mais perus e que
deixem a fauna humana transitar por todo o conhecimento (e seu amplo
significado) sem as amarras das mensalidades de classe e salve-se quem puder,
porque diploma não salva. Isso eu sei!